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4.4.03

With a little help from Mário Zambonin, ou Bom dia, Ozu

Expor-se por inteiro num blog (que digo, expor-se por inteiro no verbo) não equivale necessariamente a dizer o que se comeu no café da manhã. Eu sempre gostei de escrever, e sempre escrevi, mas jamais tive um "diário". Nada contra, é claro.

Na quarta-feira reencontrei uma amiga do trabalho, que esteve afastada. Ela me contou que, nas últimas chuvas, metade de sua casa foi destruída num deslizamento de terra. E, quase chorando, disse-me ter encontrado forças ao pensar na minha vida.

A tragédia não levou ou feriu nenhum dos seus, e isso é o que importa; e embora se trate afinal de uma banalidade, foi o que fiz questão de dizer a ela. Calei-me quanto a tudo o mais; sei que a espécie humana, nessas horas, não sabe se furtar ao gozo do sutil sentimento de crueldade que encontra sua realização num interminável interrogatório sobre os detalhes da tragédia, mas nisso, como em tantas outras coisas, dou mostras do meu pertencimento a outra espécie.

Depois que nos despedimos, fiquei a pensar. Minha vida... então ela pôde confortar alguém, mesmo reduzida a um resumo de três linhas? Então... então talvez essa história mereça ser contada. Dia desses, quem sabe, e (provavelmente) não aqui. Por ora, estou menos preocupado com a minha vida, atual ou pregressa, e mais preocupado com a vida do meu pensamento. Ou melhor, com a vida do pensamento. Por sorte, a espécie humana não encontra o menor sentido em proposições como essa, o que é a melhor garantia de que este blog será sempre freqüentado por alguns poucos e seletos visitantes trazidos pelo acaso. Não, não é elitismo. Se você se considera um eleito, ótimo para você. Aqui seus valores não valem. Aqui não tem valor sua raça, credo, crenças, opiniões, leis, e mesmo o seu conhecimento, e até mesmo a sua sabedoria. Aqui você está tão nu quanto no dia em que nasceu, só que preparado para conhecer o valor da nudez. Pois é da nudez, do vazio da roda, é desse quase-nada que emerge o pensamento.

Bem-vindo, Mário Zambonin. Pronto para ajudar-me a espantar os visitantes?



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