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17.4.04

O impacto da Ética de Spinoza em nossas vidas

Estive durante alguns dias conhecendo o orkut, where the elite meet, como diria Margo Channing. Mas não é hora de falar sobre isso. Quero apenas traduzir uma resposta que deixei numa comunidade sobre Spinoza. A pergunta era a seguinte:

"O poder de qualquer filosofia ética mede-se pelo seu impacto na nossa vida real. Assim, algum dos leitores de Spinoza que estão aqui sente que formou uma idéia adequada do "Deus" de Spinoza e que essa idéia fez por ele o que o livro cinco promete?"

Ora, essa pergunta está baseada numa falácia. Seu argumento seria mais ou menos o seguinte: o impacto ético da filosofia de Spinoza só acontece quando atingimos o chamado terceiro gênero de conhecimento (idéias que exprimem a essência de Deus, das coisas exteriores e de nós mesmos); isso é muito difícil (como o próprio Spinoza adverte na última frase da Ética); logo, o livro de Spinoza não tem nenhum impacto na nossa vida de todos os dias.

Portanto, uma pergunta bastante maldosa. Minha resposta, porém, foi serena e amistosa:

Como você sabe, existem três tipos de idéias. Deus é uma essência singular, e portanto sua idéia pertence ao terceiro gênero de conhecimento, o mais elevado.

Porém as noções comuns (segundo gênero de conhecimento) também são idéias adequadas. Assim, se alguém consegue formar noções comuns, ele/ela já está acima do primeiro gênero de conhecimento - e a maioria de nós, como você também sabe, está presa a esse tipo de conhecimento, que define nossa escravidão.

Portanto, a Ética terá o mais alto "impacto na nossa vida real" se conseguirmos alcançar o terceiro gênero de conhecimento, já que ele exprime o mais alto nível de conhecimento; porém esse impacto começa com o segundo gênero.

Em outras palavras, ninguém pega numa guitarra pela primeira vez e toca como Hendrix - nem mesmo Hendrix. A razão é uma conquista progressiva.


Tudo isso está bem explicadinho numa aula de Deleuze sobre Spinoza que estará disponível aqui em breve.

Mas nós... nós dizemos "o sol derrete a cera e endurece a argila" e, ao dizer isso, pensamos estar entendendo alguma coisa. Não entendemos nada ainda. Isso é o primeiro gênero de conhecimento, é a mera constatação de um efeito, e não um conhecimento pelas causas. Conhecer? Entender? Nós temos preguiça até de fazer uma simples consulta ao dicionário! Tá bom, então. Mas não vale reclamar depois. Não comigo. A moleza acabou. Agora eu só quero ao meu lado aqueles para os quais o estalar do chicote é música.



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